Seis iniciativas apresentaram objetivos e desafios para buscar incentivos para 2025
O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, em parceria com a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, promoveu em 27 de novembro o Pitch de Inovação em Saúde Digital, consolidando esforços conjuntos para a transformação tecnológica no setor. O evento, realizado no Instituto de Radiologia do HCFMUSP, marcou o encerramento de uma trilha de aprendizado que resultou no desenvolvimento de oito modelos assistenciais de Saúde Digital na esfera pública do Estado de São Paulo, visando melhorar a qualidade e o acesso do atendimento médico dos pacientes. Quatro modelos foram apresentados no Pitch – TeleAPS, AME+ Digital, TeleUTI e TeleSAP -, além de dois novos modelos convidados a participar – Exames in Loco e PA Digital.
A abertura contou com a participação do Prof. Dr. Carlos Carvalho, diretor de Saúde Digital do HCFMUSP; do Prof. Dr. Giovanni Guido Cerri, presidente do Conselho de Inovação do InovaHC; do engenheiro Antônio José Pereira, superintendente do hospital; e da Cristina Balestrin, coordenadora de Saúde Digital do Governo do Estado de São Paulo. Eles destacaram os avanços em conectividade, telemedicina e inteligência artificial aplicados à saúde pública. “Transformação digital não é apenas implementar tecnologia, mas promover uma mudança cultural significativa em toda a cadeia de saúde”, enfatizou o Prof. Carlos Carvalho.
Conheça as iniciativas apresentadas
Quatro modelos existentes e dois novos foram convidados a falar; a condução desse momento foi feita por Júlio Melo, acadêmico em gestão da inovação.
- TeleAPS
Busca ampliar o acesso à saúde e fortalecer a estratégia de Saúde da Família no SUS, utilizando tecnologia digital. Apesar dos avanços do SUS nos últimos 30 anos, como aumento da expectativa de vida e redução da hospitalização, desafios persistem, como a baixa cobertura da atenção básica em São Paulo (68%) e a carência de médicos especializados em Medicina de Família (apenas 5%).
O modelo propõe inovações como teleatendimento especializado acessível (incluindo tradução em Libras), atendimento domiciliar digital com tablets e internet para pacientes acamados, e planos terapêuticos digitais. Além disso, inclui capacitação contínua para equipes de atenção primária, com foco em educação permanente e monitoramento de indicadores.
O programa busca ainda aumentar a resolutividade dos atendimentos (80% em casos mediados por tecnologia), reduzir demandas reprimidas e garantir cuidados integrados e personalizados. Também promove educação em saúde digital, formação de profissionais capacitados e melhorias na infraestrutura tecnológica e interoperabilidade dos sistemas de saúde.
- AME+ Digital
No Estado de São Paulo, a espera por consultas especializadas pode ultrapassar um ano. Em 2023, o tempo de espera foi identificado como a principal queixa dos usuários do SUS, agravando desfechos de saúde e elevando custos.
A iniciativa utiliza uma plataforma de teleatendimento que oferece consultas especializadas de forma descentralizada, reduzindo custos, tempo de espera e a necessidade de deslocamentos. A solução também inclui triagem automatizada baseada em protocolos, capacitação contínua para profissionais de saúde e polos físicos de apoio para quem enfrenta barreiras digitais. Os profissionais envolvidos são qualificados pelo Hospital das Clínicas e pela USP, garantindo atendimento de alta qualidade.
Desde sua implementação, em 2024, a iniciativa superou desafios como resistência à tecnologia e baixa alfabetização digital. Em 2025, expandirá sua atuação com mais especialidades, maior carga horária médica, consolidação da rede e maior integração tecnológica. Com impacto direto em 27 milhões de usuários do SUS, o programa promete reduzir filas, melhorar a qualidade de vida dos pacientes e promover equidade em saúde no maior estado do Brasil.
- TeleUTI
O cuidado intensivo no Estado de São Paulo conta com 7.200 leitos de UTI e um número limitado de especialistas. Esses desafios, especialmente graves em regiões remotas, aumentam custos, taxas de mortalidade e tempo médio de permanência hospitalar.
A TeleUTI conecta equipes locais a especialistas em terapia intensiva, oferecendo 90 minutos diários de teleconsultorias para discussão clínica e capacitação, promovendo autossuficiência das equipes locais. Inspirada em um projeto implementado durante a pandemia de Covid-19, que reduziu a mortalidade e o tempo de internação, a iniciativa agora integra novas tecnologias, como videoconferências conectadas ao prontuário eletrônico, inteligência artificial para apoio diagnóstico e protocolos acessíveis via chatbot no WhatsApp.
A solução inclui uma plataforma de educação com interações síncronas e assíncronas e o uso de tablets nas unidades. Além disso, centros replicadores espalharão o modelo pelo estado, fortalecendo uma rede de UTIs de excelência e preparando o sistema para futuros desafios.
Os benefícios projetados incluem uma redução de 20% no tempo médio de internação, 10% na taxa de mortalidade, capacitação de mais de 500 profissionais e economia de R$ 76 milhões. Os principais desafios, como infraestrutura e recursos financeiros, serão enfrentados por meio de suporte técnico e parcerias público-privadas.
- TeleSAP
Iniciativa de teleatendimento para o sistema prisional do Estado de São Paulo, que busca superar as barreiras históricas no acesso à saúde enfrentadas por mais de 200 mil pessoas privadas de liberdade em 182 unidades prisionais. Atualmente, 53 mil desses indivíduos estão em locais sem médicos, o que agrava complicações de saúde e eleva os custos operacionais com deslocamentos.
A TeleSAP oferece teleconsultas e teleconsultorias realizadas por médicos especialistas em Medicina de Família e Comunidade do HCFMUSP. Usando plataformas digitais seguras e agendas flexíveis, o programa permite atendimento rápido e continuidade do cuidado dentro das próprias unidades prisionais, eliminando a necessidade de deslocamentos.
Entre os benefícios destacados, estão a economia operacional, ocupação eficiente da agenda (superior a 80%) e alta resolutividade (acima de 80%). Além disso, a iniciativa promove saúde de forma humanitária, escalável para outras unidades e estados, e contribui com dados para saúde pública, vigilância sanitária e epidemiológica.
Apesar de desafios como integração de sistemas e logística, investe em tecnologias avançadas, capacitação e adesão digital. A iniciativa transforma o acesso à saúde no sistema prisional, integrando tecnologia, humanização e eficiência, com impactos positivos tanto intramuros quanto extramuros.
- Exames in Loco
Uma extensão do modelo TeleSAP. Atualmente, o acesso a exames complementares enfrenta desafios logísticos e altos custos, resultando na realização de apenas 20% dos exames solicitados, o que prejudica a qualidade do atendimento médico.
O projeto propõe levar exames diretamente às unidades prisionais por meio de unidades móveis equipadas com dispositivos portáteis. Os exames seriam realizados no momento da consulta, com resultados disponíveis em até 15 minutos, permitindo decisões médicas imediatas. A solução também promete reduzir os custos em 30% em comparação ao deslocamento dos pacientes.
Os principais desafios incluem a criação de fluxos operacionais sustentáveis, que será feita com a participação das equipes locais, e a integração automatizada entre as unidades prisionais e os centros de referência. A proposta visa uma jornada 100% digital, com maior segurança e resolutividade, além de eliminar a necessidade de deslocamentos desnecessários.
O impacto esperado é uma maior eficiência e humanização no atendimento à saúde prisional, redução de diagnósticos tardios, mais integração entre saúde e tecnologia, e o fortalecimento do Programa de Inovação em Saúde Digital como referência.
- PA Digital
Aplicativo inovador que busca transformar o atendimento de urgência no sistema de saúde público. O objetivo é reduzir em até 30% os atendimentos de baixa complexidade nos pronto-socorros, que atualmente representam 30% do total e geram custos anuais de R$ 1,9 bilhão. Esses atendimentos prolongam filas de espera, com tempos médios de 6 horas, e reduzem a eficiência do sistema.
O PA Digital utiliza inteligência artificial para triagem qualificada e oferece atendimento remoto 24 horas por dia, eliminando a necessidade de deslocamento do paciente. Com escalabilidade, o aplicativo pode atender inicialmente o Estado de São Paulo e, futuramente, todo o Brasil, beneficiando uma população SUS-dependente de 27 milhões no estado.
Os principais benefícios incluem a redução de custos em 78% com atendimentos físicos, desafogamento do sistema, redução de filas, maior assertividade no direcionamento dos pacientes e melhoria da experiência e qualidade do atendimento.
Entre os desafios, destaca-se a interoperabilidade dos sistemas de saúde existentes. Para enfrentá-lo, serão utilizadas APIs e mapeamento das redes para integração, além de funcionalidades como georreferenciamento para localizar unidades próximas em tempo real. A implementação prevê tutoriais, suporte contínuo e ações educativas para facilitar o uso do aplicativo.
Banca avaliadora destaca São Paulo como projeto-piloto para o país
As iniciativas apresentadas foram avaliadas por uma banca de profissionais renomados, que elogiou o impacto e o potencial das ideias apresentadas.
A Profa. Linamara Batistella, presidente do Conselho Diretor do Instituto de Medicina Física e Reabilitação do Hospital das Clínicas, reforçou que a atenção primária é essencial: se for resolutiva e bem direcionada, pode resolver metade dos problemas e economizar metade dos custos. “As iniciativas apresentadas indicam um avanço significativo e apontam para um futuro promissor, beneficiando o sistema de saúde e a população brasileira como um todo”, disse.
Em seguida, o Prof. Paulo Saldiva, médico patologista e professor da Faculdade de Medicina da USP, enfatizou a necessidade de integrar dados entre sistemas público e privado e criar métricas para melhorar a eficiência do atendimento, como na saúde prisional e para pessoas em situação de rua: “A interoperabilidade e o uso estratégico de informações como poluição e CEP podem transformar o diagnóstico e o atendimento”.
Cristina Balestrin apontou a importância de se preparar para futuras emergências sanitárias e fortalecer serviços especializados em regiões de difícil acesso. “Estamos construindo um legado para que iniciativas como a interoperabilidade de prontuários clínicos alcancem milhões de pessoas”, afirmou.
Já Thiago Lazareto, coordenador do Hackathon HCFMUSP, destacou a diferença entre tecnologia e inovação, sugerindo maior foco em métricas para mensurar o impacto das iniciativas. “O desafio não é só tecnológico, mas também de processos e serviços inovadores, como soluções digitais que reduzam filas e melhorem o acesso”, explicou.
O debate também evidenciou o papel de São Paulo como modelo para o país, com projetos-piloto que podem nortear políticas públicas em todo o Brasil. Encerrando as falas da banca, a Dra. Paula Scudeller ressaltou que o maior desafio agora é construir uma jornada digital integrada para os cidadãos, com foco em promoção da saúde. “Há três elementos fundamentais para promover mudanças: oportunidade, motivação e capacidade técnica. Esses pilares permitiram avanços significativos nas iniciativas apresentadas”, disse. “O próximo grande desafio é construir uma jornada digital do paciente no Estado de São Paulo, com foco não apenas no tratamento de doenças, mas também na promoção da saúde”, finalizou.
Após a discussão e avaliação, três dos projetos foram premiados. O terceiro lugar ficou com o projeto Exames In Loco, que recebeu um curso de comunicação em situações críticas. O segundo colocado, AME+ Digital, foi reconhecido por sua contribuição à digitalização do atendimento, e recebeu como prêmio o mesmo curso. O vencedor do evento foi o projeto TeleAPS que, além de um troféu, ganhou um curso do HCX em Inteligência Artificial e Saúde do Futuro.
Já no fim do evento, os avaliadores concluíram que os avanços apresentados representam um legado para a saúde pública paulista. Além das iniciativas assistenciais, o programa de forma geral incorpora pesquisa e inovação, posicionando São Paulo como referência nacional na integração de tecnologia e saúde. O evento foi encerrado com um clima de celebração e otimismo, destacando o papel fundamental da tecnologia na construção de uma saúde pública mais eficiente e acessível.